quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Os 5 grandes mitos sobre jovens e livros juvenis

Hoje, no blog do Conservatório, escolhi falar sobre uma coisa que tem me incomodado desde uma conversa no MSN. O cara leu a sinopse d’O Conservatório e, a partir dela, disse que era algo para “adolescentes idiotas”. Mais ou menos no mesmo dia, um moço no Twitter ficou surpreso por eu ter comentado que comprei Crepúsculo numa promoção de 9,90 do Submarino. Pensou que eu odiava o livro.


Pode ser que ele tenha pensado isso por conta de zoações no blog Bram & Vlad. Pode ser que o culpado tenha sido esse post. Mas eu fiquei incomodada. Fazer piada de uma coisa é odiá-la? Reconhecer as limitações dela significa que você não gosta?

Bom, o fato é que eu gosto da série Crepúsculo. Não me entendam mal. Gostar não é amar, o livro não está no meu top 30 livros preferidos e nem sequer no meu top 10 histórias de vampiros (vou divulgar qualquer dia). Mas eu gosto. Acho divertido pra se passar o tempo, e pra se acalmar os hormônios em fúria lá pelo meio do ciclo menstrual. (É, os homens definitivamente não entendem isso...)
Agora, “adolescentes idiotas”? Caros amigos precocemente envelhecidos, que reclamam com todas as forças contra crepusculetes, emos e família Restart, o post de hoje é especialmente para vocês. Vou chegar de voadora nos cinco mitos mais recorrentes sobre adolescentes e livros juvenis. Proteja-se dos cacos ali atrás do muro de proteção, porque me baixou um humor Caçadores de Mitos, e vocês sabem que eles não detonam mitos apenas figurativamente.


Mito 1 – As adolescentes que soltam gritinhos quando o lobisomem aparece sem camisa no filme de Crepúsculo são menos inteligentes ou críticas que outras adolescentes que não exibem esse tipo de comportamento.

Esse é um mito recorrente e é um tremendo de um preconceito. Os que perpetuam esse tipo de opinião geralmente são homens, e acho que sei por quê.
Vamos voltar às aulas de biologia. O que é a adolescência biologicamente falando? Simples: entre outras coisas, é quando o ser humano fica sexualmente maduro e começa a produzir uma série de novos hormônios. Esses hormônios causam alterações de humor e cada sexo tem o seu, bem diferentes um dos outros.
Os meninos são expostos a doses cavalares de testosterona. O efeito colateral disso, tipicamente, é um comportamento agressivo e/ou competitivo. Não é à toa que homens jovens gostam de games violentos, eles os ajudam a libertar esse excesso de impulsos agressivos que eles, talvez, não tenham outra forma de extravasar.
Já as meninas vivem um misto de estrogênio e progesterona, se alternando ao longo do mês. É quando elas são apresentadas ao famigerado ciclo menstrual. Cara, se o misto de hormônios já bagunça a cabeça dos homens, pensem no que não faz na das meninas. Nós ficamos mais emotivas e desenvolvemos o hábito incontrolável de admirar garotos lindos (geralmente mais velhos), mesmo que só platonicamente. Aliás, eles nem precisam ser lindos de fato, nossa imaginação superfértil é que os faz assim. Nossos hormônios nos fazem agir como pavoas, babando pela cauda do pavão mais colorido. Mais tarde, nossos critérios para homens atraentes provavelmente vão mudar bastante, mas nesse momento de transição, é quase compulsivo.
Sendo assim, os gritinhos ao ver garotos bonitos não têm nada a ver com maturidade ou inteligência, têm muito mais a ver com personalidade. Uma menina mais tímida não vai gritar, mas certamente vai ficar toda “aiaiai”, como diria Sakura Kinomoto. Tenham paciência com as gritadeiras e não as desprezem, isso é uma fase e passa. Se não estivessem gritando por Edward e Jacob, certamente estariam gritando por outro bonitinho com carinha de menino qualquer. (Nesse momento, estou tendo lembranças de mim mesma, com quatorze anos, assistindo Entrevista com o Vampiro. Aiai.)
Vamos deixar claro: as forças que fazem as garotas gritarem por Edward Cullen são as mesmíssimas que fazem os garotos sentirem o que sentem quando estouram a cabeça de um zumbi num jogo ultrarrealista: hormônios. Vivam com isso.


Mito 2 – Ah, mas os ataques das adolescentes contra o Stephen King por ter criticado a Stephenie Meyer, sim, são provas de pouca inteligência ou capacidade crítica.
Esse mito é recorrente entre homens e mulheres. E é coisa de quem esqueceu o que é ser adolescente. Já falei no mito 1 sobre a biologia da adolescência. Agora, vou falar um pouco na psicologia.
Psicologicamente, a adolescência não é mais fácil que fisicamente. Até uns dias atrás, o indivíduo era uma criança bonitinha e todo mundo tinha paciência com ele. De repente, os adultos parecem pensar que aquela criança recebeu a visita da Fada da Maturidade, que, com sua varinha de condão, a transformou em um adolescente intelectual, educado, responsável e independente.
Se você acreditava na Fada da Maturidade, más notícias. Ela não existe. A do dente, sim. A Madrinha, sim. Sininho, sim. Mas a da Maturidade, não.
Adolescentes são aquelas mesmas crianças de antes, mas que de repente, passaram a sofrer doses cavalares e constantes de substâncias químicas reguladoras de humor e passam a ser tratados como mini-adultos, não como aprendizes de adultos. Então, eles têm que se virar com o que alcançam pra aprenderem sozinhos a serem adultos. É a hora que eles vão analisar friamente o comportamento dos adultos ao redor para tentar decidir o que vai entrar na constituição de sua personalidade ou não. É quando vão em busca de valores, de identidade, enfim, quando procuram vários modelos para absorver os conhecimentos do jogo que terão que jogar quando forem adultos de fato. Nessa idade, procuram amigos para trocar idéias e não terem que trilhar sozinhos esse aprendizado difícil e assustador.
Nada mais natural que adolescentes tenham ídolos. Um ou vários, a gosto do freguês. Quando um adolescente escolhe um ídolo, ele está dizendo ao mundo que gostaria de seguir aquele modelo de vida. Daí, vem alguém e critica esse ídolo. Pra qualquer pessoa adulta, isso é algo normal, direito de expressão, e tal. Para um adolescente, que ainda não conhece as regras da vida social, isso é uma ofensa pessoal. O crítico não está criticando só o ídolo. Ao falar que esse ídolo é ruim, está criticando a capacidade do adolescente de escolher seus modelos.
Trollagem adolescente é irritante, mas a gente tem que dar um desconto. O adolescente é o cara que foi obrigado a jogar um jogo sem saber as regras, e nem sempre tem alguém paciente do lado pra explicar se ele pode ou não jogar o dado e avançar uma casa. É preciso corrigir os adolescentes, sim, para ajudá-los a crescer. Mas nunca desprezá-los e dizer que são idiotas pelas coisas que fazem. Muitos trolls adolescentes, quando devidamente podados, se tornam pessoas muito inteligentes e razoáveis, boas de se conviver. Conheço alguns exemplos.

Quando não se poda os trolls adolescentes, eles viram aqueles adultos barraqueiros e frustrados que todo mundo que já freqüentou fóruns na internet já conheceu. Portanto, ajude o bem estar da nação e trate com respeito e firmeza os adolescentes revoltados, não com desprezo e escárnio. A sociedade agradece.

Mito 3 – As pessoas que aprendem a gostar de ler com Crepúsculo e outras modinhas não vão procurar os clássicos, só vai ficar em leituras semelhantes.
Oh, bem, claro, duh. Ninguém vai aprender cálculo diferencial e integral assim que aprende a somar. Tem um longo caminho a ser percorrido entre alguém que só lia as fofocas da revista e alguém que lê James Joyce. Logo depois de ler um livro pop, a pessoa vai querer outro livro pop. Pode levar anos até ela achar que esse tipo de leitura já deu o que tinha que dar e partir pra outras mais difíceis, com temas mais profundos.
Muitas pessoas acham bonito esfregar na cara de crepusculetes que lêem coisas mais “intelectualmente superiores”, achando que, com isso, elas vão se sentir envergonhadas em gostar de Crepúsculo e ler outras coisas.
Bom, você gostaria mais de Matemática se estivesse penando com seu dever de casa sobre inequações do segundo grau e eu dissesse que resolver uma integral tripla com coordenadas polares é algo que qualquer idiota conseguiria fazer?

Mito 4 – Escritores de livros juvenis e infanto-juvenis têm menos qualidade e mérito que os adultos.
OK. Fechem todas as escolas. O que importa é a faculdade, porque ela que vai te dar especialização para um emprego. Para que submetermos as crianças a aulas chatas e maçantes de escrita em cadernos de caligrafia? Para que darmos a elas livros didáticos rasos e incompletos, que não informam todo o mecanismo bioquímico por trás da fotossíntese? É tão simples!
É uma tendência humana incensar só quem deu as belas formas de uma casa, sem dar muito crédito a quem fez o trabalho braçal de erguer seus alicerces e fazer uma fundação segura e sólida. Pense em um cientista famoso qualquer. Você provavelmente encontrará quem foi o professor dele em sua especialidade. Pense em um escritor, e você terá uma lista de influências literárias e filosóficas que ele pode ter sofrido. Mas tente descobrir quem o ensinou a ler e escrever (caso não tenha sido a mãe ou alguém que teve uma história tocante ou interessante). Se essa pessoa não existisse, o cientista e o escritor em questão simplesmente não teriam trabalhado em seus campos de atuação, e seus nomes não teriam nos atingido. Ainda assim, os professores de ensino básico dessas pessoas são, em geral, ilustres desconhecidos.
Não precisamos ir longe. Uma simples pesquisa entre seus conhecidos mostra o quanto ganha um professor primário e o quanto ganha um de ensino médio, como são valores díspares e como o trabalho de lançar as fundações do conhecimento na criança é visto como algo “fácil” e pouco digno de valor. Sendo assim, não é surpreendente que ainda haja quem pensa que não há necessidade de existirem autores de livros infanto-juvenis/juvenis/jovens adultos/best sellers.
Volto a bater na tecla: a gente não aprende a gostar de ler do nada, já com um clássico complexo na mão. Se você não consegue entender como alguém lê os livros do Dan Brown feliz da vida, como coleciona todos os Paulos Coelhos sem remorso ou como essa pessoa torce o nariz pro Machado de Assis ou pro José de Alencar, dá pra simular isso muito bem. Pegue uma gramática de polonês e um dicionário polonês-português. Agora, pegue Guerra e Paz (ou outro similar, que você não tenha lido ainda) escrito em polonês e leia. Lá pela segunda semana, quando você não agüentar mais ler as cinco primeiras páginas pra entender o que está havendo, guarde Guerra e Paz e leia O Pequeno Príncipe em polonês.
Dá para entender agora por que quem não é fluente em leitura prefere obras de linguagem simples, trama pouco complexa e tamanho relativamente pequeno, não?
Com o tempo, você, caso faça esse experimento, vai ficar cada vez mais fluente em polonês e poderá, em certo ponto, pegar de volta o Guerra e Paz para ler. Mas não vão ser um ou dois livros simples que vão te habilitar a isso. Daí eu pergunto: o que seria de você se não fossem os autores que produziram os livros pequenos e simples a mancheias?
Tudo bem, o autor de livros para crianças e jovens tem grandes chances de não entrar no rol de grandes nomes da literatura mundial, caso fique só nessa área. Entre outras coisas porque atualidade é algo que fisga muito os jovens em uma leitura, e a atualidade envelhece. Mas isso não significa que o papel desse autor é menos importante ou menos nobre que o de um autor de livros clássicos.
E se você acha um absurdo que tais livros “para iniciantes em leitura” batam sempre recordes dos mais vendidos, em detrimento do que possuem mais qualidades acadêmicas, lembre-se de quantos coleguinhas começaram com você uma faculdade qualquer, e de quantos efetivamente terminaram. Nem todo iniciante se sente motivado a ir até o fim em algum aprendizado, então, é absolutamente normal que livros de “qualidade duvidosa” (tremo quando vejo isso) estejam sempre no topo dos mais vendidos. Provavelmente, sempre estarão, e acho que qualquer autor, não importa seu estilo, devia ficar feliz com isso. Quanto mais exemplares o best seller vende, maior a chance de novos leitores chegarem à “maturidade”.


Mito 5 – Escrever livros infanto-juvenis é fácil.
Quando ouço isso e penso nos mais de cinco anos que passei mexendo no meu romance juvenil beta, dá vontade de bater na pessoa que professa esse mito. Sério.

Quer dizer, a pessoa honestamente acha que, quando diz “estou escrevendo um juvenil”, isso imediatamente a isenta de todo e qualquer esforço de pesquisa, de composição de personagem e de verossimilhança da trama? Olha, isso em si já é um mito muito grande. Agora, quando ela ainda se justifica dizendo que “os adolescentes não vão notar, mesmo, eles engolem qualquer coisa”, aí, eu só tenho duas coisas a dizer: (1) Seu preguiçoso! (2) Seu babaca! Nunca subestime seu público-alvo, ele pode saber bem mais que você.

Como eu disse nos mitos anteriores, escrever juvenil é uma escolha de tema e linguagem. Não é uma escolha de mais ou menos esforço, mais ou menos preocupação com a qualidade. Isso também se aplica a infantil, infanto-juvenil, e mesmo best sellers. Uma coisa é você reconhecer que as pessoas que vão te ler provavelmente ou vão estar atrás de entretenimento puro, ou estão dando os primeiros passos para serem leitores “maduros”. Outra, totalmente diferente, é achar que isso faz dessas pessoas um bando de idiotas, que não têm a mínima chance de saber como uma instituição do mundo real funciona, ou como uma pessoa apaixonada se comporta. Digamos que você escreva um livro juvenil que tenha uma guerra imaginária onde o Brasil tomou parte, e que não pesquise lhufas sobre nosso exército antes de escrever. O jovem médio pode até não entender como funciona a hierarquia do Exército Brasileiro, mas e se seu livro for lido pelo filho de um soldado? Que tal receber uma crítica arrasadora e embasada de um rapaz de 15 anos? Nem que seja para o bem do seu ego, respeite quem te lê.


Era isso, pessoal. Se tem algum mito que vocês achem importante e queiram detonar, os comentários estão abertos pra você. Faça bom uso!

10 comentários:

  1. De fato, não gosto de nenhum dos exemplos que você usou, mas sou obrigado a concordar com tudo. E nem precisava de tanto, é só eu mesmo lembrar do que eu lia/ouvia/assistia quando tinha meus 14-15-16 anos.

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  2. Eu realmente concordei com tudo, já que entendo. O que mais me irrita, é o fato de saberem que eu já li Crepúsculo, acham que eu sou uma doida ou retardada. Não é o meu livro preferido, prefiro muitos outros, mas não quer dizer que você já fez tal coisa, você está dentro daquele padrão. E o último mito é o que eu mais concordei, já que eu estou em metade de um livro, que realmente é muito difícil de fazer. D:

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  3. Fenomenais o seu texto e sua análise. Clara, bem argumentada, lúcida. Parabéns.

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  4. Voadora tripla na cara de Burguesia!!!

    Brincadeiras a parte Dri, esse seu post é perfeito por vários motivos, e eu cito alguns deles a seguir:

    Leitor elitista: O maldito leitor elitista se considera o supra-sumo da elite intelectual e graças a isso desconsidera toda sua trajetória de vida unicamente para manter um status.

    Esse mesmo leitor elitista é o que vai xingar obras de menor valor acadêmico ou que tratem de ideias de menor profundidade intelectual (segundo seus próprios valores) desconsiderando qualquer valor que seja diferente.

    Brasil: A realidade brasileira dos livros é possível de ser vista por qualquer um que queira, basta ver a somatória de fatores que desestimulam crianças e adolescentes a criarem o hábito de ler. Certos discursos apenas irão causar maior desconforto e retirar talvez o único estímulo que faça certas pessoas criarem tal hábito.

    Poderia me alongar por demais aqui devido a ver um post tão bem produzido e escrito, mesmo não gostando de Crepúsculo eu posso dizer que não gostava originalmente de Harry Potter.

    Hoje vejo algumas crianças que cresceram e adquiriram o hábito de ler unicamente por terem tido contato com uma obra "simples".

    Bjs parabéns!

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  5. Naaa CAAARRRAAAAA!!!! UAhuahuHA

    Adorei o texto, Strix! E até me ajudou a diminuir um pouco meu desgosto por adolescentes!

    E eu também dava gritinhos assistindo Entrevista com Vampiro! E eu assistia a Rainha dos Condenados só pq o Lestat era O PEDAÇO!! UAhUahUHAuHA Mas o filme era bléééé!!!!

    =**

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  6. Aah que medo, sou adolescente e tudo que li acima é verdade.

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  7. Fazer o que ? A nova moda pe criticar modas . :D

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  8. É, a nova moda é ser pseudo-intelectual e criticar tudo e todos mesmo sem entender de nada.

    Não sou adolescente, li todos da série crepúsculo e achei divertido. Não são grandes livros e o filme dá vergonha de ver como conseguiram escolher atores tão inexperientes, havendo tantos atores adolescentes que são verdadeiros prodígios. Mas tive bons momentos lendo. É isso que conta, não? O pessoal prega tanto a abolição do preconceito contra negros, homossexuais; deviam abolir o preconceito contra livros infanto-juvenis e best-sellers. E daí que eles fazem mais sucesso que os livros "bons"? Por que isso dói tanto?

    Ótima crítica. Concordo com cada palavra.

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  9. Adorei o texto que vc escreveu! Havia esquecido como é ser adolescente e andei criticando negativamente muitos que curtem Restart. Meus gostos por música e literatura mudaram muito, mas admito que ainda gosto de ouvir Backstreet Boys. A verdade é que as pessoas não toleram os gostos pessoais das outras, por isso fazem comentários ofensivos. O seu texto me fez abrir mais a mente e deixar de ser arrogante e intolerante. Parabéns!

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  10. Parabéns!
    Não teria dito melhor.
    Vou divulgar seu post porque mais (muito mais)gente precisa ler o seu post.

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